Ciclo do charque em Pelotas
     Como síntese histórica do Ciclo do Charque em Pelotas transcrevemos a seguir trecho da justificativa do Projeto de autoria do Vereador Gilberto Cunha, que deu origem à Lei nº 4.977/03, que institui o Roteiro das Charqueadas como referência cultural e que marca para as gerações atuais e futuras o principal cenário do ciclo econômico do charque neste município.


POSSE DA TERRA


Viajantes da Província do Rio Grande do Sul – Debret

(*)Jean Baptiste Debret (Paris, França 1768 - idem 1848) integra a Missão Artística Francesa, que vem ao Brasil em 1816. Instala-se no Rio de Janeiro e, a partir de 1817, torna-se professor de pintura em seu ateliê. Em 1818, realiza a decoração para a coroação de D. João VI, no Rio de Janeiro. De 1823 a 1831, é professor de pintura histórica na Academia Imperial de Belas Artes, no Rio de Janeiro, atividade que alterna com viagens para várias cidades do país, quando retrata tipos humanos, costumes e paisagens locais. Por volta de 1825, realiza gravuras a água-forte, que estão na Seção de Estampas da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Em 1829, organiza a Exposição da Classe de Pintura Histórica da Imperial Academia das Belas Artes, primeira exposição pública de arte no Brasil. Deixa o Brasil em 1831, retorna a Paris com o discípulo Porto Alegre. Entre 1834 e 1839, edita, em Paris, o livro Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, em três volumes, ilustrado com aquarelas e gravuras produzidas com base em seus estudos e observações.

Fonte: www.cliohistoria.hpg.ig.com.br – 29/10/2007

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     São indispensáveis alguns aspectos históricos sobre o tema, breves e gerais, começando pelo processo de consolidação da posse das terras no sul do Rio Grande, após a retirada dos espanhóis em 1776.
     "A posse oficial dos terrenos do Serro Pelado iniciou em 1780. Em 1785, o capitão Antônio Ferreira dos Santos realizou um levantamento dos posseiros e proprietários desse lugar. Contou 40 pessoas. Dessas, 14 não tinham títulos de propriedade e eram, todas, militares. As propriedades foram concedidas pelos governadores José Marcelino de Figueiredo e Sebastião Xavier, e pelo comandante militar da área, Rafael Pinto Bandeira. Vinte e dois proprietários, até aquela data, já tinham vendido o que lhes havia sido concedido.
     Destacaram-se, para um melhor detalhamento da área, as propriedades localizadas entre o arroio Pavão e o arroio Grande. Sete vieram a formar o município de Pelotas. Chamavam-se Feitoria, Pelotas, Monte Bonito, Santa Bárbara, São Tomé, Santana e Pavão. Com exceção da Feitoria, que se limitava pela laguna e os arroios Grande e Correntes, todas as outras tiveram os seguintes limites: ao sul, o sangradouro; ao norte, a serra dos Tapes; a leste e oeste, intercalavam-se os arroios Pavão, Padre-Doutor ou Tomé, Fragata ou Moreira, Santa Bárbara e Pelotas.
     Na estância do Monte Bonito, houve uma segunda divisão de terras, entre 19 pequenos proprietários. As estâncias deram origem a mais ou menos uma dúzia de charqueadas. Com a segunda divisão, de pequenos lotes de terrenos, foram implantadas perto de 30 estabelecimentos, destinados exclusivamente ao preparo da carne salgada e seus subprodutos." (1)
     "Ao longo do século XIX, a sesmaria de Pelotas resultou em cinco estâncias e sete charqueadas. As fazendas chamaram-se: Patrimônio ou Sá; Graça; Palma; Galatéia e Laranjal ou Nossa Senhora dos Prazeres. Um dos saladeiros situava-se no Laranjal, num lugar chamado Picada Real. Os outros seis, localizaram-se na margem esquerda do arroio Pelotas, nos seguintes lugares: na Graça; no Moreira; na Costa; no Fontoura; no Castro e na Palma." (1)


SESMARIA DO MONTE BONITO


Charruas civilizados (peões) – Debret

(*)Jean Baptiste Debret (Paris, França 1768 - idem 1848) integra a Missão Artística Francesa, que vem ao Brasil em 1816. Instala-se no Rio de Janeiro e, a partir de 1817, torna-se professor de pintura em seu ateliê. Em 1818, realiza a decoração para a coroação de D. João VI, no Rio de Janeiro. De 1823 a 1831, é professor de pintura histórica na Academia Imperial de Belas Artes, no Rio de Janeiro, atividade que alterna com viagens para várias cidades do país, quando retrata tipos humanos, costumes e paisagens locais. Por volta de 1825, realiza gravuras a água-forte, que estão na Seção de Estampas da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Em 1829, organiza a Exposição da Classe de Pintura Histórica da Imperial Academia das Belas Artes, primeira exposição pública de arte no Brasil. Deixa o Brasil em 1831, retorna a Paris com o discípulo Porto Alegre. Entre 1834 e 1839, edita, em Paris, o livro Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, em três volumes, ilustrado com aquarelas e gravuras produzidas com base em seus estudos e observações.

Fonte: www.cliohistoria.hpg.ig.com.br – 29/10/2007

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     "A sesmaria do Monte Bonito tinha os seguintes limites naturais: três cursos de água, canal São Gonçalo, arroios Pelotas e Santa Bárbara e a serra dos Tapes. Os arroios desaguavam no canal e este dava acesso à lagoa Mirim e a Banda Oriental e à laguna dos Patos e oceano Atlântico. As vias navegáveis garantiam a exportação dos produtos, bem como a importação de mão-de-obra escrava e do sal, servindo de esgoto. A vizinhança com o Prata e com os campos neutrais, a "terra de ninguém", povoada de gado, propiciava o abastecimento de animais." (1)
     "Da sesmaria do Monte Bonito, resultou o cerne do núcleo saladeiril pelotense e, consequentemente, a cidade. A localização e o processo de concessões de terras, entre outros fatores, ocasionaram em uma tipologia de ocupação espacial e um programa de necessidades específicos. Instalou-se um complexo de aproximadamente 30 indústrias de salga contíguas, apoiadas por toda uma série de instalações, infra-estrutura, comércio, transportes e demais serviços. Nas charqueadas do Monte Bonito, não se criava o gado. O que definia uma maior divisão do trabalho. A estância situava-se em outro lugar. Ali, os animais eram somente transformados em produto, como charque, couro, sebo, graxa etc. Além disso, a maior parte desses estabelecimentos possuía olarias em seus programas de necessidades." "Dois terços dos estabelecimentos estavam no arroio (Pelotas), o restante no canal (São Gonçalo)." (1)
     "Em 1911, um dos descendentes dos proprietários da fazenda e charqueada da Graça, o escritor João Simões Lopes Neto, arrolou 23 fábricas, na margem direita do arroio Pelotas, e oito, na orla norte do canal São Gonçalo." "A descrição dessa área fabril, iniciou na serra dos Tapes e passou pela datas de matos, alcançando o arroio Quilombo e a sesmaria propriamente dita. Desceu o Pelotas, em direção ao oriente, cruzou o Retiro e , acompanhando a dobra que fazem as águas do arroio, o Cotovelo. No mesmo sentido, atingiu o Cascalho, a Boa Vista, a Costa, o Areal e o Atoladouro, e, por fim, na Boca do Arroio, avançou pelo canal São Gonçalo, tomando o rumo do interior; chegou ao Passo dos Negros, à cidade e à Tablada. Ao longo da travessia, localizaram-se as charqueadas e os locais de apoio da produção. Especificaram-se os programas, os materiais e as técnicas de construção. Ao mesmo tempo, relataram-se fatos, acontecimentos e atos das pessoas que viviam, exploravam, produziam e organizavam esses lugares. Destacaram-se alguns proprietários e a população servil de cada estabelecimento. Possivelmente, esboçou-se o que tenha sido o palco da escravidão no Rio Grande." (1)
     Segundo Fernando Osório (2), José Pinto Martins, em 1780, "criou a indústria saladeiril no Rio Grande do Sul", quando estabeleceu a primeira charqueada na região, localizada, exatamente, "sobre a margem direita e cerca de uma légua da foz do rio das Pelotas". Ester Gutierrez confirma que "o núcleo saladeiril sulino foi implantado a partir de 1780".(1)


PRIMEIRO LOTEAMENTO


Rio Grande do Sul – Debret

(*)Jean Baptiste Debret (Paris, França 1768 - idem 1848) integra a Missão Artística Francesa, que vem ao Brasil em 1816. Instala-se no Rio de Janeiro e, a partir de 1817, torna-se professor de pintura em seu ateliê. Em 1818, realiza a decoração para a coroação de D. João VI, no Rio de Janeiro. De 1823 a 1831, é professor de pintura histórica na Academia Imperial de Belas Artes, no Rio de Janeiro, atividade que alterna com viagens para várias cidades do país, quando retrata tipos humanos, costumes e paisagens locais. Por volta de 1825, realiza gravuras a água-forte, que estão na Seção de Estampas da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Em 1829, organiza a Exposição da Classe de Pintura Histórica da Imperial Academia das Belas Artes, primeira exposição pública de arte no Brasil. Deixa o Brasil em 1831, retorna a Paris com o discípulo Porto Alegre. Entre 1834 e 1839, edita, em Paris, o livro Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, em três volumes, ilustrado com aquarelas e gravuras produzidas com base em seus estudos e observações.

Fonte: www.cliohistoria.hpg.ig.com.br – 29/10/2007

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     Ester Gutierrez relata que, em 10 de outubro de 1806, vinte e cinco anos após a fundação da primeira charqueada, José Aguiar Peixoto e sua mulher, Ana Leocádia da Cunha, venderam um terreno, que tinham comprado de José Gonçalves da Silveira Calheca, a Antônio Francisco dos Anjos. Em fevereiro de 1813,o capitão-mor Antônio dos Anjos e Padre Felício Pereira acordaram construir neste terreno a igreja e a morada do vigário, onde hoje é a catedral, "porém, a doação apôs uma condição: que lhe fosse permitido aforar os terrenos em volta, nos quais começaria a crescer o casario da nova freguesia". Nascia, assim, o primeiro loteamento da cidade que se estendia num quadrilátero de 52,8ha limitado, aproximadamente, pelo Passeio Público (Av. Bento Gonçalves), Rua das Lavadeiras (Rua Prof. Araújo), Rua da Horta (Rua Voluntários da Pátria) e Rua das Fontes (Rua Alm. Barroso). A freguesia de São Francisco de Paula, denominação em homenagem ao santo do dia da expulsão dos espanhóis (2 de abril de 1776), foi formalizada através de alvará do príncipe regente Dom João, em 7 de julho de 1812. Em 7 de novembro de 1827, o inventariante das terras do casal capitão Francisco Pires Cazado e Mariana Eufrásia da Silveira, entregou os terrenos doados para servidão do povo de Pelotas, obrigatórios para a instalação do segundo loteamento, ao sul do primeiro. As construções urbanas cresciam em direção ao canal São Gonçalo. (1)
     "Em 19 de agosto de 1825, foi instalado o Logradouro Público da povoação de São Francisco de Paula. Em 1851, foi medido judicialmente." "No sentido longitudinal alcançava quase os 9.000m; no transversal, na parte mais larga, 1.500m e na mais estreita, 400m. Daí, fechava-se um triângulo, que determinava a Tablada." "As "sobras" destinadas ao Logradouro Público, facilitaram o comércio do gado. Ficavam por conta dos estancieiros e de seus peões as desvantagens do transporte dos rebanhos. Depois da viagem, das dificuldades, das perdas, do emagrecimento do gado, e ao lado de muita oferta, ficava difícil aumentar o preço do boi. Com o dinheiro conseguido pelas vendas nas mãos, compravam o que lhes abastecesse até o próximo ano, procuravam determinados serviços e escolhiam algum tipo de divertimento. Essas atividades impulsionaram o desenvolvimento urbano. Os navios que levavam o charque traziam mercadorias. Comerciantes, artesãos, profissionais de todos os tipos se estabeleciam." (1)

Lei nº4.977 de 14 de outubro de 2003

     Art. 1º - Fica instituído o Roteiro das Charqueadas como referência de fatos históricos e de bens materiais e imateriais, pertencentes à cultura do ciclo econômico do charque no Município de Pelotas, nos termos e para fins dos artigos 146, 168, 205, 206, 221 e 224 da Lei Orgânica Municipal.

     Art. 2º - O Roteiro das Charqueadas tem por finalidade dar orientação geográfica às atividades educacionais, culturais, turísticas, sociais e econômicas, com vistas ao estudo, conhecimento, valorização, preservação e utilização da memória do ciclo econômico do charque no Município de Pelotas.

     Art. 3º - O Roteiro das Charqueadas é definido por uma rota terrestre e outra fluvial, que transitam pelo cerne do núcleo charqueador de Pelotas.
     § 1° - A rota terrestre é definida pelas seguintes vias públicas:
     a) Av. Salgado Filho;
     b) Av. São Francisco de Paula, desde a Tablada até a Av. Ferreira Viana;
     c) Antigo Corredor das Tropas, no prolongamento da Av. São Francisco de Paula, desde a Av. Ferreira Viana até a Estrada do Engenho, passando pela Ponte dos Dois Arcos;
     d) Av. Cidade de Rio Grande, a partir da Estrada do Engenho até a Rua Dr. Mário Meneghetti;
     e) Estrada do Engenho;
     f) Estrada do Passo dos Negros até a Boca do Arroio Pelotas;
     g) Corredor da Prainha;
     h) Corredor no prolongamento da Rua Cap. Nelson Pereira, desde a Av. Ferreira Viana até o Corredor da Prainha;
     i) Av. Adolfo Fetter até o Recanto de Portugal;
     j) Rua Cap. Nelson Pereira;
     k) Av. Barão de Corrientes;
     l) Av. Auguste de Saint Hilaire;
     m) Estrada da Costa;
     n) Estrada da Boa Vista, desde o Logradouro Público até a Estrada da Costa;
     o) Estrada do Cascalho até o Cotovelo;
     p) Estrada da Galatéia.
     § 2° - A rota fluvial é definida pelas seguintes vias públicas:
     a) Canal São Gonçalo, desde o Veleiros Saldanha da Gama até a Boca do Arroio Pelotas;
     b) Arroio Pelotas desde a sua foz até a Charqueada da Graça.

     Art. 4º - São locais de referência no Roteiro das Charqueadas:
     a) O Logradouro Público, área limitada pelas Avenidas Salgado Filho, Eng. Ildefonso Simões Lopes, Alfredo Theodoro Born e Zeferino Costa;
     b) a Tablada, área limitada pelas Avenidas Dom Joaquim, República do Líbano, Salgado Filho e Fernando Osório;
     c) o Matadouro Público, limitado pela Rua Guilherme Wetzel, Av. Dom Joaquim e Av. Fernando Osório;
     d) as charqueadas;
     e) o Engenho Cel. Pedro Osório;
     f) o Obelisco Republicano;
     g) a Ponte dos Dois Arcos, no antigo Corredor das Tropas;
     h) a Ponte dos Escravos, na Estrada da Costa sobre a Sanga do Passo Fundo;
     i) a Cacimba da Nação;
     j) o terminal ferroviário na Boca do Arroio;
     k) o Passo dos Negros, no Canal São Gonçalo;
     l) o Passo do Castro, no Arroio Pelotas;
     m) o Passo dos Fontoura, no Arroio Pelotas;
     n) o Passo do Assumpção, no Arroio Pelotas;
     o) o Passo do Moreira, no Arroio Pelotas;
     p) o Passo do Cascaes, no Arroio Pelotas.

     Art. 5º - Serviços, obras e melhoramentos públicos realizados no Roteiro das Charqueadas deverão sempre respeitar e destacar os seus valores educacionais, culturais, turísticos, sociais e econômicos.

     Art. 6º - O Poder Público Municipal ao oficializar denominações das vias públicas no Roteiro das Charqueadas deverá conservar os nomes tradicionais consagrados pela população e pelas anotações históricas relativas às origens da cidade e ao ciclo do charque.

     Art. 7 º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação e revogam-se as disposições em contrário.

 

     Portanto, fica claro que a cidade implantada num sítio de maior altitude e melhor drenado do que as várzeas dos estabelecimentos do charque, foi resultado do florescimento econômico das charqueadas. Cultuar a memória do ciclo do charque é cultuar a memória da cidade e de suas origens.

TRABALHADORES E ETNIA


Armazém de charque – Debret

(*)Jean Baptiste Debret (Paris, França 1768 - idem 1848) integra a Missão Artística Francesa, que vem ao Brasil em 1816. Instala-se no Rio de Janeiro e, a partir de 1817, torna-se professor de pintura em seu ateliê. Em 1818, realiza a decoração para a coroação de D. João VI, no Rio de Janeiro. De 1823 a 1831, é professor de pintura histórica na Academia Imperial de Belas Artes, no Rio de Janeiro, atividade que alterna com viagens para várias cidades do país, quando retrata tipos humanos, costumes e paisagens locais. Por volta de 1825, realiza gravuras a água-forte, que estão na Seção de Estampas da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Em 1829, organiza a Exposição da Classe de Pintura Histórica da Imperial Academia das Belas Artes, primeira exposição pública de arte no Brasil. Deixa o Brasil em 1831, retorna a Paris com o discípulo Porto Alegre. Entre 1834 e 1839, edita, em Paris, o livro Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, em três volumes, ilustrado com aquarelas e gravuras produzidas com base em seus estudos e observações.

Fonte: www.cliohistoria.hpg.ig.com.br – 29/10/2007

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     Aspecto muito importante é o que diz respeito à mão-de-obra escrava e a composição étnica na sociedade da época. Segundo Ester Gutierrez, "o gado ia desde a sua comercialização, na Tablada, até a exportação do produto, no porto de Rio Grande, nas mãos dos cativos."
     "Mais da metade da população servil das fábricas era especializada. Os campeiros, na mesma porcentagem que nos estabelecimentos que possuíam estância, ocupavam os potreiros, vizinhos ao Logradouro Público. Os carneadores e serventes distribuíam-se na mangueira de matança, cancha, galpões, varais e pilhas de embarque. O transporte no arroio Pelotas, no canal São Gonçalo, na laguna dos Patos e no porto de Rio Grande era realizado por escravos marinheiros.
     Metade dos senhores possuía em seu plantel marujos cativos. A outra metade, possivelmente, contrataria os serviços dos primeiros. A produção e o transporte do charque eram apoiados pela mão-de-obra de escravos de ofício e domésticos, que ajudavam na manutenção do próprio plantel de cativos, como os cozinheiros; das instalações, como os carpinteiros e os pedreiros; dos senhores e de suas famílias, como os engomadores etc." (1)
     Segundo o censo da população da Vila de São Francisco de Paula (Pelotas) no ano de 1833, a população total era de 10.874 pessoas, sendo 62,1% de negros (51,7% escravos e 10,4% libertos), 36% de brancos e 1,6% de índios. O porcentual de homens e mulheres escravos na vila seria respectivamente 71% e 29%.(1)

O MARCO LEGAL
     O ciclo do charque iniciado em 1780 encerrou-se na década de trinta do século XX. Desde então, o sítio destas atividades, nas margens do Arroio Pelotas e do Canal São Gonçalo, no Logradouro Público, na Tablada e nas vias de comunicação, sofreu grandes modificações no uso do solo, com significativa perda dos referenciais geográficos e históricos.
     Este projeto de lei propõe a instituição do Roteiro das Charqueadas com a finalidade maior de identificar na cidade atual as áreas e locais que constituíram o núcleo charqueador principal no Rio Grande do Sul. Estudar, conhecer, valorizar, preservar e utilizar a memória deste ciclo econômico interessa à vida educacional, cultural, turística, social e econômica de nossa comunidade, para podermos fruir destes bens através de ações de iniciativa tanto privada como pública.
     A definição do Roteiro das Charqueadas se limitou às vias públicas que dão acesso aos espaços do trabalho nas charqueadas e da movimentação próxima da mão-de-obra, das matérias primas e dos produtos. Portanto, este projeto de lei não trata de tombamento ou inscrição de bens no Inventário do Patrimônio Cultural.
     Em vista da imensa riqueza que o tema traz para nossa vida comunitária, a prestação de serviços, a realização de obras e a introdução de equipamentos urbanos por parte do Poder Público no roteiro, ora definido, deverão respeitar e salientar os valores acima destacados.
     É importante para o povo da comunidade identificar o Logradouro Público como sendo a área que ia desde o Corredor das Tropas (atual Av. Salgado Filho) até a Estrada dos Maricás (atual Av. Alfredo Theodoro Born); e saber que o Matadouro Público ficava na Tablada, na sua ponta sul, limitada pela Estrada do Retiro (atual Av. Fernando Osório) e pela Sanga do Matadouro (atual Rua Guilherme Wetzel).
     O acesso aos espaços do complexo saladeiril (charqueadas, Tablada, Logradouro Público, estradas e corredores, pontes, passos etc.) e o reconhecimento e valorização dos seus aspectos funcionais deverão ser facilitados pela identificação e divulgação popular dos toponímicos originais, referidos nos textos da época dos pioneiros ou preservados pela tradição, com as sucessivas denominações até às atuais, através de atos complementares decorrentes desta lei.

A REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
     Porém, como justificativa maior deste projeto de lei, não poderia deixar de citar tudo que foi pesquisado, estudado, relatado e contado no conjunto da produção intelectual sobre a nossa Pelotas representada por Alberto Coelho Cunha (Antigalhas de Pelotas), Ângelo Pires Moreira (Pelotas na tarca do tempo), Eduardo Arriada (Pelotas: gênese e desenvolvimento urbano), Ester J. B. Gutierrez (Negros, charqueadas & olarias), Fernando Luís Osório (A cidade de Pelotas), Heloísa Assumpção Nascimento (Nossa cidade era assim) João Simões Lopes Neto (História de Pelotas), Luís de Mello Varoto & Leonor Almeida de Souza Soares (Lendo Pelotas), Mário Osório Magalhães (História e tradições da cidade de Pelotas), Mário Rosa (Geografia de Pelotas) e Zênia de Leon (Ponte dos Dois Arcos).
     Finalmente, destaco a obra "Negros, Charqueadas & Olarias: Um estudo sobre o espaço pelotense" de Ester J. B. Gutierrez, da qual foram extraídas quase a totalidade das citações utilizadas nesta justificativa.
     1 GUTIERREZ, Ester J.B. Negros, charqueadas e olarias: um estudo sobre o espaço pelotense. 2.ed. -Pelotas: Ed. Universitária/UFPEL, 2001
     2 OSÓRIO, Fernando. A cidade de Pelotas. 3.ed.rev. Pelotas: Armazém Literário


Arroio Pelotas
 

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