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A ideia de festejar o aniversário da cidade tomando por base a fundação da freguesia quem concebeu, projetou, promoveu, levou adiante até a plena aceitação, até a realização final, foi ninguém menos que João Simões Lopes Neto, o consagrado autor dos Contos gauchescos e das Lendas do Sul. Agiu praticamente sozinho, mas como suporte à sua determinação teve o apoio decisivo da Bibliotheca Pública Pelotense.
Em reunião de 9 de abril de 1910, a diretoria da Bibliotheca - na presença do escritor, e certamente por inspiração sua - assumiu a responsabilidade exclusiva de organizar as comemorações do centenário de Pelotas, que anunciou para daí a dois anos, no dia 7 de julho de 1912. Simões Lopes Neto, com a autoridade de quem havia publicado em 1905, nos anais da própria Bibliotheca, a primeira monografia sobre a história da cidade, encarregou-se de elaborar o projeto; prevendo atividades que se estenderiam por mais de uma semana, apresentou-o no dia 9 de agosto de 1911 à mesa diretora. Já ocupava, nessa ocasião, o cargo de primeiro secretário da entidade - e, como tal, de especialíssimo redator das suas atas.
Passados dois meses, entregou ao público o primeiro número da Revista do 1º Centenário de Pelotas, inteiramente escrita e produzida por ele e por ele apelidada de "Revista Centenária". Saíram outros seis exemplares, na verdade fascículos, à razão de um por mês, o último numerado como 7° e 8°, correspondente a abril e maio de 1912. Tinha o subtítulo de "publicação auxiliar para a comemoração projetada pela Bibliotheca Pública Pelotense", mas foi mais do que isso. Sobretudo ao ampliar, com riqueza de informações, o seu primitivo texto de 1905, Simões Lopes facilitou o trabalho a que Fernando Osório se dedicaria, dez anos depois, no transcorrer de outro centenário - o da Independência do Brasil: a elaboração de A cidade de Pelotas, até hoje a nossa obra mais completa, no gênero história geral.
Como se podia prever, o povo pelotense, sabidamente lúdico e comprovadamente cioso das suas tradições, festejou com alegria e júbilo o evento, e durante longos dez dias. Entre 6 e 15 de julho, cumpriu na íntegra o projeto do escritor.
No entanto ele, superada a euforia das comemorações, logo compreendeu que se corria um risco: por inércia, permitir que o alvará de dom João - muito velho na ocorrência, muito recente na celebração -, depois de tanto esforço voltasse a ser, outra vez, nada mais do que um registro histórico. Então, no ano seguinte, no primeiro dia de julho, através do jornal A Opinião Pública, convocou os estudantes de Pelotas - alunos de todos os graus: acadêmicos, ginasianos e colegiais - para que se engajassem, nesse sétimo mês e uma vez por ano, no que intitulou de "Semana Centenária", apontando como modelo o festival da primavera, ainda hoje efusivamente reeditado, nos parques e nas ruas, pelos jovens argentinos.
Voltou ao tema em mais duas oportunidades; no dia 7, quando justificou a colocação de uma lápide alusiva ao centenário numa parede externa da Catedral; e no dia 15, quando imaginou o futuro da ideia que implantara.
Nessa última matéria, intitulada O centenário da Centenária, apostou que, daí a um século, os seus concidadãos ainda festejariam nessa data o aniversário de Pelotas. Acertou, na mosca. Quanto a ele, Simões Lopes Neto - que usava, como articulista, o pseudônimo de Serafim Bemol - pareceu-lhe óbvio garantir, com amarga ironia, que já não seria em 2013 "nem bemol, nem bequadro, nem tremi-fusa, nem sustenido, nem tom nem som nenhum..." Aí, nessa projeção pessoal, redondamente enganou-se.
Fonte: MARIO OSORIO MAGALHÃES - Historiador.
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